terça-feira, 21 de janeiro de 2014

cena de um cotidiano (comum).

depois de cumprir o compromisso que criei instantaneamente no intuito de ter uma desculpa que convencesse a mim mesma a botar as fuças na rua...a volta para a casa. mas, a vontade já se tornara outra. eu não queria mais voltar a enfurnar minha fuça naquela casa, pelo menos não naquele instante. a cabeça estava cheia, o peito esmagado. não havia mais nada a ser feito senão ouvir, ouvir, ouvir. ouvir um e depois ouvir o outro, quem sabe até o momento de explodir.

o sinal fecha. olho para a frente sem nada olhar. (o mundo rodava, era a labirintite ou a pinga vagabunda que eu tomara?). vejo dois corpos - entre tantos - atravessando a faixa de pedestres. o sinal abre. sigo a seta que eu mesma sinalizei (confesso que cumpri toda a curva só para calar aquele tic tic irritante). viro à direita e permaneço no lado direito. percebo que meu pescoço se inclina totalmente na mesma direção que meu olhar – que, sem razão alguma, ainda acompanha aqueles dois corpos. como pedestres parecem seguir o mesmo caminho que eu. um deles também me acompanha com os olhos. desvio o olhar rapidamente - para impedir o acidente que, naquele dia especialmente, eu estava mais do que propícia a causar. volto a olhar. agora é só um. e prossegue me acompanhando. piso bem leve no acelerador, diminuo a marcha. aquele homem acelera o passo. mais um sinal fechado. ele também pára. sorri fechando os olhos. é bonito. quando me percebo, eu também estou sorrindo. (que vontade de ficar por aqui, de passar a tarde toda assim). o sinal abre. penso em parar. penso em abrir a porta e convidá-lo para entrar. ele vem se aproximando como se, nesses segundos de tomada de decisão, ele soubesse minha dúvida e estivesse pronto à cessá-la. sinto medo. sinto vontade. me enxergo como ser desejante. desejante de arriscar. desejante de esquecer. desejante de - por algumas horas - ser só indivíduo que cumpre seu próprio desejo. viro a esquina afim de dar a volta no quarteirão e voltar para aquele mesmo ponto. o ponto em que minha cabeça rodopiante reflete sobre ficção e realidade. sobre realidade criada que pode parecer roteiro de ficção. sobre ficção acreditada que pode parecer cena de um cotidiano comum. faço esse caminho. ele ainda está ali, e o sorriso se rearranja no rosto quando vê meu carro descendo a mesma. sigo ainda mais devagar. o sinal não vai fechar. não dará tempo de conseguir pegar o lado direito para virar. não vou consigo parar. ao mesmo tempo, consigo ler em seus lábios “por favor, pare.”. eu não posso parar. eu não consegui parar. fui embora sem saber. sonho não era - a rua permanecia igual, todos seguiam o mesmo ritmo dos afazeres rotineiros, a casa que eu entrei prosseguia pesada. nada estava desfeito. sonho não era. voltei para a casa, trazendo de volta somente a covardia. covarde! covarde por não se permitir desejar.

domingo, 19 de janeiro de 2014

a alegria é delicada.
delicada tal qual a própria constatação.
frágil. frágil mesmo.

acho que nunca percebi a alegria. medo de, na tentativa de represá-la em memória, acabar por perdê-la. mas sinto (quando absorta nesses pensamentos) que alguma coisa aqui dentro grita. talvez um sentimento de que sei exatamente o que é sentir alegria. escassos flashs mentais de instantes de sorriso espontâneo, incontrolável. sorriso secreto. secreto, secreto sim. hoje em dia, raros os que se dedicam a distinguir sorrisos. a desnudar realidades. a se aprofundar nas revelações súbitas. talvez nada revele mais do que um sorriso incontrolável – ainda que tímido. sorriso dos olhos. instante de olhos marejados e risonhos.



quão delicada e frágil é a alegria. tão fácil desgraçá-la se imediata é a percepção de se estar experimentando. melhor guardar em segredo. se possível até de mim mesma. deixe que me venha aquela  (posterior) sensação interior e gritante... tirando-me um sorriso de olhos categoricamente incontrolável.