domingo, 24 de agosto de 2014

Fluxo.

“A vida não é argumento; entre as condições da vida poderia estar o erro.” (NIETZSCHE, 1978, p.202)

queria prosseguir a pensar. a cabeça, à essa altura, já estava estafada. lembrei-me de ser, também, corpo. entreguei para o corpo a tarefa do pensamento. o não-pensamento do corpo. falar tinha de ser experienciar. eu nada tenho a dizer, enquanto não digo. eu nada posso ser, enquanto não sou. sinto. personagem. todos os outros que contenho, que acolho em mim. todas as lutas que me sensibilizam. e as que não. por que não? todo santuário que passa pela matéria. e que apodrece. corpo que transcende de tanto ser corpo. vivenciar esse momento-limite enquanto instante crucial, fundamental. fotografá-lo com retinas não-retilíneas. curvar. curvar-se. todo mistério e toda fé. entrelaçar de dedos. dar-se as mãos. doar-se para a experiência, para a comunhão. negar separações; bestas, bestiais. comungar consigo; seu corpo, sua pele, seu suor, seu sangue. ritual de fé. de purificação. de proliferação. 

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

“Aventura nunca tentada, navegar o convexo do olho sem quebrar segredo, nem casca.”


hoje eu voltei a colocar aquela camisola. meu corpo já é outro. ela, ainda a mesma. tentamos nos ajustar. a felina me chama para a caça. e eu quase que sinto vergonha de lhe confessar que não sou da caça. apesar disso, me reconheço em bicho. tatear no escuro.  o prazer inexplicável do desconforto. me forço à solidão? “eu bestando numa vida antiminha”. eu neguei aquele brinde que ofereceu a nós. neguei por tédio. um desconhecido se aproxima. me julga e me aponta as covardias. não é por humanidade que o faz; é por prazer mesquinho, também covarde. não desisti. não se desiste da ação que nunca se topou executar. a despeito de, não abortar os possíveis. tornar a ação fluída, não obstruída pelo pensar incessante e cruel. desconstrução. para que o valor prossiga sendo a construção. “a vida pulsa, pulsa, pulsa...”. é o que me diz o tic tac do novo relógio. escrever, escrever, para não se perder...nunca mais. 

domingo, 3 de agosto de 2014

duas lições (ou uma só).


chamem de destino ou do que quer que seja. fato é: há de se aprender a ser humilde frente aos mandos e desmandos desta vida.
(“hei de aprender. hei de aprender. hei de aprender...” repito como um mantra).
há vezes em que não há o que ser feito.
aceite? aceite.

solidão é bacana em momentos tais. mas autossuficiência é papo pra boi dormir. talvez a presença de um outro me ajudaria no jogo de forças contra uma ou outra imposição da vida.
(“interdependência. interdependência. interdependência...” repito como um mantra).
preciso do outro para lutar, para inverter jogos.
hoje eu perdi? hoje eu perdi.


sexta-feira, 1 de agosto de 2014

retrato.

tem ódio, tem doçura nestes olhos que me encaram. me provocam. me jogam com violência no mundo. num mundo hostil coberto de humanos. num mundo humano coberto de hostis, de ardis. em silêncio, pareço-me concentrar no enigma da esfinge; em poucos segundos, o jogo vira...o enigma sou eu. é aquele rosto que quer me descobrir. retrato imóvel que me ofende. me declara culpada, pecaminosa. do quê me acusa? o quê me sugere? me sinto presa de uma pesca covarde; uma pesca com rede. mais alguns segundos e eu morro asfixiada. meu próprio retrato. meus próprios olhos.