quarta-feira, 26 de agosto de 2009


Discípula de meu avô. Bastante para aquela que assumiria como ofício o sonhar. Um contador de histórias que me presenteara com muitos contos e personagens.Só hoje sou capaz de me dar conta que todos estavam condensados e inseridos na figura do velho jacu.
De mim, pequena e sem plantios, fez terreno fértil.
O homem de gestos largos e sorriso exorbitante, o príncipe da pitinha que chegara num burro manco.
Aquele que, como ninguém, assumiu ser tonto sem ser tonto, na vaidade do caipira alumiado pelas promessas da cidade.O olhar que me concedeu alvará para ser e buscar todos aqueles que fora.A profecia de suas contidas palavras,que me atrevo a dizer versificadas e portadoras de incrível força poética.A transparência da pele escurecida por anos de refúgio na memória, para que fosse capaz de suportar a falta do sol escaldante e da terra, o qual por toda a vida quis voltar. A maciez e delicadeza do toque das mãos grossas e calejadas.
Mudaste a música com sabedoria suprema, e ao fiel papagaio coube reconhecer. Um casamento perfeito: meu velho e sua ave, que reconheciam-se numa gargalhada escandalosa, deixando em pé os cabelos de minha avó.
Se hoje viessemos a conversar, sei que muito me censuraria. Pelo corte do cabelo, pela lágrima dos olhos e pelas tantas perguntas à vida. Me perdoe, mas hei de confessar que por vezes o sorriso é forçado, e o encanto do ofício não me basta. Fui envenenada pelo derrame de vazios, e talvez isso me impeça estar entregue à sua lição de simplicidade. Mas os anos hão de passar e no fim de meus dias hei de entender seu sorriso pleno e sua completude...e sairei altiva com seu chapéu cantarolando uma moda de viola que colocará em suma os perdizes dessa vida.

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